Sábado, esquecendo-me da minha condição de casada há dez, quase onze anos e com quem eu era casada, fui à perfumaria e comprei um presente para o meu marido. Explico: romantismo não é uma grande qualidade sua. Nunca foi meloso e desde o nosso primeiro encontro ele já deixou isso bem claro para mim. Eu também sempre tentei ser bastante pé no chão. Mas com toda essa propaganda que fica ao nosso redor, às vezes a gente se deixa levar. Cheguei em casa depois da aula e da quadrilha do filho primogênito e dei o perfume a ele, que ficou todo sem graça e não disse nada. Mais tarde, com a desculpa de que iria buscar nosso filho na casa de um amiguinho, ele demorou mais que o necessário e à noite, me deu, pasmem, uma garrafa de "Amarula". Confesso, adoro. Mas isso é lá presente que se dê? Eu perguntei se ele havia esquecido de comprar um presente e ele negou. Disse que já estava comprado há muito tempo. Mas eu o peguei na mentira ao descobrir em seu bolso uma nota da casa de vinhos com data de sábado. Ele riu amarelo. Eu também ri, constatando, tristemente, que ele havia esquecido o dia dos namorados.
Mais tarde fomos dormir, e ele sequer me disse nada. O cansaço do dia nos consumira. O caçula, extremamente gripado, havia nos tirado as forças até para ficar deitado vendo tv, pois havia passado a noite anterior em claro e no dia seguinte, tívemos nosso afazeres. Caímos no sono rapidamente, enquanto na minha mente se passavam pensamentos tais como a constatação de que o meu corpo já não empolgava mais o meu marido...pensei nas minhas primeiras rugas e nos primeiros fios brancos que me recuso a pintar e nos meus quilos a mais...acabei lembrando que ele também já não me empolgava tanto e como eu, ironicamente, me sentia no direito de me sentir ofendida por ele estar sentindo exatamente o mesmo que eu sentia. Esse foi meu último pensamento antes de adormecer. A vida é mesmo muito engraçada.
